quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Artigo

A SÚMULA VINCULANTE REGULADORA DO USO DE ALGEMAS E MODELOS HERMENÊUTICOS PROPOSTOS NO ESTADO DE DIREITO




Milani Maurílio Bento1




SUMÁRIO: INTRODUÇÃO; 2 – DAS DECISÕES PRECEDENTES À SÚMULA VINCULANTE NÚMERO 11; 3 – DA SÚMULA VINCULANTE; 4 – MODELOS HERMENEUTICOS; 5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS; REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.




RESUMO: O presente artigo examina o aspecto formal da Súmula Vinculante de número 11, aprovada em Sessão Plenária do Supremo Tribunal Federal no dia 13 de agosto de 2008, que trata do uso de algemas. Após, confronta referida Súmula com modelos hermenêuticos positivistas e neo-constitucionalistas verificando que base teórica estaria a ampará-la.



PALAVRAS-CHAVE: Súmula Vinculante; Positivismo; Substancialismo; Procedimentalismo.




ABSTRACT: This article examines the formal aspect of eleventh “Sumula Vinculante”2, adopted in session of the brazilian Supreme Court on August, 13, 2008, wich addresses about the use of handcuffs. After this, the presente text compares the Sumula with hermentuticals models proposed a State of Law.


KEYWORDS – Súmula Vinculante; Legal Positivism; Substancialism; Procedimentalism.












1 - INTRODUÇÃO

Em Sessão Plenária do dia 13 de agosto de 2008, os Ministros do Supremo Tribunal Federal aprovaram a Súmula Vinculante número 113, que indica em quais situações é possível o uso de algemas sem que tal medida constitua responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou autoridade, nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere e ainda responsabilidade civil do Estado.

A Súmula Vinculante referida se funda em quatro julgamentos anteriores da Suprema Corte, dos quais dois proferidos pela 2ª Turma4, um pela 1ª Turma5 e o último pelo Tribunal Pleno6, objetos de análise do primeiro título.

De início cumpre esclarecer que não é objeto do presente artigo o debate sobre o poder e alcance de uma súmula vinculante, tampouco sobre o erro ou acerto de sua inclusão na Carta Política maior de nosso País7. Para os fins deste trabalho será considerado o texto expresso no artigo 103-A8, e seus parágrafos, da Constituição Federal, como texto posto e apto a gerar conseqüências no mundo jurídico e da vida, ou na classificação de Ferrajoli9 o dispositivo legal será considerado vigente e válido, da mesma forma a Lei 11.417/06 que o regulamenta.

Não será também objeto do presente estudo o aspecto material da Súmula Vinculante de número 11, ou seja, o texto não busca responder indagações como: Fere a dignidade humana o uso de algemas? O uso de algemas interfere no resultado de um julgamento? Caso positivo, em qualquer julgamento ou apenas naqueles de competência do tribunal do júri?

A importância do artigo reside na resposta a outras questões que de igual forma necessitam do debate de acadêmicos e juristas, como: A edição da Súmula Vinculante que regula o uso de algemas observa o artigo 103-A, da Constituição Federal, dispositivo que possibilita sua própria existência? A Súmula Vinculante que regula o uso de algemas é fruto e se vincula a que modelo hermenêutico dentre os observáveis e teorizados no Estado de Direito?

A primeira indagação surge da necessidade de verificação quanto à observância, por parte dos Ministros da Suprema Corte, do disposto Constitucional que os ampara na edição das súmulas vinculantes. Uma resposta negativa necessariamente deverá trazer argumentos para a propositura de cancelamento ou revisão da Súmula Vinculante número 11, assim como levará a novos questionamentos como: Um magistrado ou tribunal poderá deixar de aplicar a Súmula sob o argumento de que é inconstitucional?

Por sua vez, o segundo questionamento, sobre a vinculação da edição da Súmula Vinculante número 11 a algum modelo hermenêutico, nasce na adoção da tese: “que nenhuma das convicções que temos, sobre o mundo e o que está nele, nos é imposta por uma recalcitrante realidade independente da teoria; de que as opiniões que temos são mera conseqüência de termos aceitado alguma estrutura teórica particular”10. E a resposta ao questionamento ganha relevo ante sua utilidade em compor parte da resposta quanto à coerência dos fundamentos teóricos utilizados pela mais alta corte de Justiça do Brasil, eis que, se nenhuma decisão se desvincula (intencionalmente ou não) a um modelo teórico de interpretação, o que se há de esperar é a coerência do órgão julgador em utilizar-se de base teórica constante, permitindo um mínimo de previsibilidade de suas decisões.

Para a resposta à primeira indagação foram analisados os dispostos constitucionais e infra-constitucionais que regulamentam a edição de súmulas vinculantes, enquanto que a resposta à segunda indagação conta com pesquisa aos artigos científicos e obras bibliográficas referidas, centrando o debate nas propostas de KELSEN, HABERMAS e STRECK, filósofos representantes do Positivismo, Procedimentalismo e Substancialismo respectivamente. O método utilizado será o indutivo.





2 - DAS DECISÕES PRECEDENTES À SÚMULA VINCULANTE NÚMERO 11

Quatro são os julgados do Supremo Tribunal Federal que tratam do tema “uso de algemas”. Estes mesmos quatro julgados são informados11 como precedentes para a edição da Súmula Vinculante de número 11.

O primeiro destes julgados (ordem cronológica) é o Recurso de Habeas Corpus nº 56.465-8, de 05/09/1978, cuja ementa apregoa:

Não constitui constrangimento ilegal o uso de algemas por parte do acusado, durante a instrução criminal, se necessário à ordem dos trabalhos e à segurança das testemunhas e como meio de prevenir a fuga do preso. Inépcia da denúncia não comprovada. RHC improvido”.



O Relator, Ministro Cordeiro Guerra, quando do relatório observa que “o fato de ter assistido algemado o depoimento testemunhal está bem justificado” e quando do voto por si proferido fez observação de que “compete ao Juiz instrutor a disciplina das audiências e a condução dos trabalhos, de modo a preservar o respeito à Justiça e a garantia da ordem”.

Em uma análise rápida desta primeira decisão invocada pelo Supremo Tribunal Federal como precedente à Súmula Vinculante número 11, é possível verificar que: a) foi proferida sob a égide de Constituição diversa daquela ora em vigor; b) não tratou com maior profundidade o assunto; c) não fez qualquer comparativo entre o uso de algemas e a Declaração Universal dos Direitos Humanos12, nem com qualquer outro princípio constitucional; d) julgou improcedente o Recurso de Habeas Corpus; e) no voto proferido informa que o respeito à Justiça e a garantia da ordem deverão ser observados pelo juiz da instrução; f) tratou do tema “constrangimento ilegal” na forma negativa, ou seja, a ementa explicita quando “não” há constrangimento ilegal, deixando de expor quando ocorrerá o constrangimento ilegal no uso de algemas, sendo impossível, inclusive, deduzir que na falta das ocorrências ali listadas (ordem dos trabalhos, preservar a segurança das testemunhas e evitar a fuga do preso), ou de qualquer uma destas, haverá constrangimento ilegal.

A segunda decisão, precedente da Súmula Vinculante 11, é o Habeas Corpus n° 71195-2, de 25/10/1994, com a seguinte ementa:

HABEAS CORPUS. Concurso material de crimes. Protesto por novo júri. Pena inferior a vinte anos. Utilização de algemas no julgamento. Medida justificada.

I - ..........

II – O uso de algemas durante o julgamento não constitui constrangimento ilegal se essencial à ordem dos trabalhos e à segurança dos presentes.

Habeas corpus indeferido”


No relatório, acolhido por unanimidade, o Ministro Francisco Rezek expôs que:

A impetração, em primeiro lugar, insurge-se contra o indeferimento do protesto por novo júri e, em segundo lugar, questiona a validade do julgamento pelo fato de o réu ter permanecido algemado em plenário, o que teria influenciado negativamente o Conselho de Sentença”.

Portanto, conforme consta da ata, havia informações de que o réu pretendia agredir o Juiz Presidente e o Promotor de Justiça, o que motivou o uso das algemas durante o julgamento”.

Sendo assim, não evidenciada interferência no espírito dos jurados, a argüição deve ser rejeitada, como já decidido no RHC 56.465...”

Em rápida análise do julgado é possível verificar que: a) foi proferido sob a égide da Constituição de 1988; b) não tratou com maior profundidade o assunto; c) não fez qualquer comparativo entre o uso de algemas e princípios constitucionais; d) julgou improcedente o Habeas Corpus; e) os julgadores decidiram que o uso de algemas, no caso, não interferiu no espírito dos jurados; f) tratou do tema “constrangimento ilegal” na forma negativa, ou seja, a ementa explicita quando “não” há constrangimento ilegal, deixando de expor quando ocorrerá o constrangimento ilegal no uso de algemas, sendo impossível, inclusive, deduzir que na falta das ocorrências ali listadas (ordem dos trabalhos e segurança dos presentes), ou de qualquer uma destas, haverá constrangimento ilegal; g) o pedido indeferido tratava da nulidade do ato processual (julgamento pelo tribunal do Júri);.

O terceiro julgado que trata do uso de algemas é o Habeas Corpus n° 89.429-1, de 22/08/2006. Da ementa:

Habeas Corpus. Uso de algemas no momento da prisão. Ausência justificativa em face da conduta passiva do paciente. Constrangimento ilegal. Precedentes.

O uso legítimo de algemas não é arbitrário, sendo de natureza excepcional, a ser adotado nos casos e com as finalidades de impedir, prevenir ou dificultar a fuga ou reação indevida do preso, desde que haja fundada suspeita ou justificado receio de que tanto venha a ocorrer, e para evitar agressão do preso contra os próprios policiais, contra terceiros ou contra si mesmo. O emprego desta medida tem como balizamento jurídico necessário os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Precedentes. Habeas Corpus concedido.


Do relatório, de lavra da Ministra Carmen Lúcia, extraímos que: “O ponto nuclear da discussão trazida à apreciação e julgamento neste habeas é um só: o uso de algemas que lhe foram postas pelas autoridades policiais e que, sustenta o Impetrante, configura forma de constrangimento tido como ilegal.”

Ainda do relatório, após digressão histórica do tema “uso de algemas”, com descrição de dispositivos legais em vigor ou que já vigoraram (Ordenações Filipinas, decretos imperiais, Lei de Execuções Penais e Lei de segurança de tráfego em águas territoriais), conclui a Ministra:

Nem de longe, portanto, se há de pensar que a utilização daquele instrumento possa ser arbitrária ou tolerada sem que regras jurídicas vigorem no País quanto ao seu emprego, pois a forma juridicamente válida do seu uso pode ser inferida a partir da interpretação dos princípios e até mesmo das regras vigentes.”



Como disposto legal infra-constitucional a fundamentar a decisão, a Ministra interpreta o “uso de algemas” como incluso no termo “emprego de força” da redação do artigo 28413, do Código de Processo Penal. Por sua vez, da Constituição Federal, o relatório apresenta como fundamentos o Artigo 5°, incisos III (assegura que ninguém será submetido a tratamento degradante) e X (proteção do direito à intimidade, à imagem e à honra das pessoas).

O relatório ainda vai sustentar que “o abuso – inclusive na utilização de algemas – deve mais que ser considerado indevido juridicamente. Em tese, deve mesmo constituir crime”.

Da análise deste julgado verifica-se que: a) foi proferido sob a égide da Constituição de 1988; b) tratou o assunto do uso de algemas com maior profundidade; c) foi fundamentando em interpretação de dispositivos legais constitucionais e infra-constitucionais; d) foi fundada nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade; e) concedeu o Habeas Corpus; f) tratou do tema “constrangimento ilegal” na forma positiva, ou seja, da ementa concluí-se que há constrangimento ilegal quando o uso de algemas for adotado sem que haja fundada suspeita ou justificado receio de fuga do preso, ou para evitar agressão do preso contra policiais, terceiros ou contra si mesmo; g) no voto, concluiu que o uso de algemas fora dos casos excepcionais constitui-se, em tese, crime.

Por fim, o último julgado a sustentar a Súmula Vinculante 11, é o Habeas Corpus 91952, julgado em 07/08/2008, pendente de publicação até a composição deste artigo, com a seguinte decisão: “O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do relator, deferiu a ordem de habeas corpus.”.

Do voto14 do Relator, Ministro Marco Aurélio, extrai-se:

Diante disso, indaga-se: surge harmônico com a Constituição manter o acusado, no recinto, com algemas? A resposta mostra-se iniludivelmente negativa”.

Em primeiro lugar, levem em conta o princípio da não-culpabilidade. É certo que foi submetida ao veredicto dos jurados pessoa acusada da prática de crime doloso contra a vida, mas que merecia o tratamento devido aos humanos, aos que vivem em um Estado Democrático de Direito. Segundo o artigo 1º da Carta Federal, a própria República tem como fundamento a dignidade da pessoa humana. Da leitura do rol das garantias constitucionais – artigo 5º -, depreende-se a preocupação em resguardar a figura do preso”.


Ora, estes preceitos – a configurarem garantias dos brasileiros e dos estrangeiros residentes no país - repousam no inafastável tratamento humanitário do cidadão, na necessidade de lhe ser preservada a dignidade. Manter o acusado em audiência, com algema, sem que demonstrada, ante práticas anteriores, a periculosidade, significa colocar a defesa, antecipadamente, em patamar inferior, não bastasse a situação de todo degradante. O julgamento no Júri é procedido por pessoas leigas, que tiram as mais variadas ilações do quadro verificado. A permanência do réu algemado indica, à primeira visão, cuidar-se de criminoso da mais alta periculosidade, desequilibrando o julgamento a ocorrer, ficando os jurados sugestionados”.


Em 15 de agosto de 1935,sendo Ministro da Justiça e Negócios Interiores Vicente Ráo, foi apresentado o Projeto de Código de Processo Penal, cujo artigo 32 vedava “o uso de força ou o emprego de algemas, ou de meios análogos, salvo se o preso resistir ou procurar evadir-se”. O projeto não vingou, em virtude da Constituição promulgada com o golpe de Estado de 1937 (em José Frederico Marques, “Tratado de Direito Processual Penal”, São Paulo, Saraiva, 1980, v. I, § 83, p. 123)”.


O novo Código somente veio à balha (ipsis literis) em 3 de outubro de 1941, passando a viger desde então o artigo 284 - “Não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso” -, que, embora não se refira expressamente ao uso de algemas, sinaliza as situações de fato extremas em que poderão ser utilizadas. É o que se constata, ainda, no artigo 292 dele constante, a revelar que, se houver, mesmo que por parte de terceiros, “resistência à prisão em flagrante ou à determinada por autoridade competente, o executor e as pessoas que o auxiliarem poderão usar dos meios necessários para defender-se ou para vencer a resistência, do que tudo se lavrará auto subscrito também por duas testemunhas”.


Na Lei de Execução Penal – nº 7.210/84 –, bem se revelou o caráter excepcional da utilização de algemas, instando-se o Poder Executivo à regulamentação no que previsto, no artigo 159, que o emprego de algemas será disciplinado por decreto federal. Se, quanto àquele que deve cumprir pena ante a culpa formada, o uso de algemas surge no campo da exceção, o que se dirá em relação a quem goza do benefício de não ter a culpa presumida, ao simplesmente conduzido, indiciado ou mesmo acusado que responda a processo-crime? Até mesmo na área penal militar, a utilização de algema é tida como excepcional”.


Vale registrar, ainda, que o item 3 das regras da Organização das Nações Unidas para tratamento de prisioneiros estabelece que o emprego de algemas jamais poderá se dar como medida de punição. Isso indica, à semelhança do que antes previsto no artigo 180 do Código de Processo Criminal do Império, que o uso desse instrumento é excepcional e somente pode ocorrer nos casos em que

realmente se mostre indispensável para impedir ou evitar a fuga do preso ou quando se cuidar comprovadamente de perigoso prisioneiro”.


A ausência de norma expressa prevendo a retirada das algemas durante o julgamento não conduz à possibilidade de manter o acusado em estado de submissão ímpar, incapaz de movimentar os braços e as mãos, em situação a revelá-lo não um ser humano que pode haver claudicado na arte de proceder em sociedade, mas uma verdadeira fera”.


A recente Lei nº 11.689, de 9 de junho de 2008, ao implementar nova redação ao artigo 474 do Código de Processo Penal, tornou estreme de dúvidas a excepcionalidade do uso de algemas”.


É hora de o Supremo emitir entendimento sobre a matéria, inibindo uma série de abusos notados na atual quadra, tornando clara, até mesmo, a concretude da lei reguladora do instituto do abuso de autoridade, considerado o processo de responsabilidade administrativa, civil e penal, para a qual os olhos em geral têm permanecido cerrados”.


Então, a Juíza deliberou: Entendo que não constitui constrangimento ilegal o réu permanecer algemado em Plenário, sobretudo porque tal circunstância se faz estritamente necessária para preservação e segurança do bom andamento dos trabalhos, já que a segurança hoje está sendo realizada por apenas dois policiais civis. Assim, indefiro o pleito da defesa”.


Não foi apontado, portanto, um único dado concreto, relativo ao perfil do acusado, que estivesse a ditar, em prol da segurança, a permanência com algemas. Quanto ao fato de apenas dois policiais civis fazerem a segurança no momento, a deficiência da estrutura do Estado não autorizava o desrespeito à dignidade do envolvido. Incumbia sim, inexistente o necessário aparato de segurança, o adiamento da sessão, preservando-se o valor maior, porque inerente ao cidadão”.


Concedo a ordem para tornar insubsistente a decisão do Tribunal do Júri. Determino que outro julgamento seja realizado, com a manutenção do acusado sem as algemas”.



Da análise do voto proferido pelo Relator, acolhido por unanimidade, verifica-se que: a) foi proferido sob a égide da Constituição de 1988; b) tratou o assunto do uso de algemas com maior profundidade; c) foi fundamentando em interpretação de dispositivos legais constitucionais e infra-constitucionais e em disposto nas regras da ONU para tratamento de prisioneiros; d) foi fundada nos princípios da dignidade da pessoa humana e na desarmonia entre o uso de algemas em um estado democrático de direito; e) concedeu o Habeas Corpus; f) afirma que o uso de algemas no plenário do júri sugestiona os jurados e desequilibra o julgamento; g) a Juíza que presidiu o Tribunal do Júri, no qual o paciente esteve algemado, justificou a medida; h) não foi aceita a justificativa do número reduzido de policiais para a segurança do recinto como autorizadora à manutenção das algemas no réu; i) faz menção às responsabilidades civil, administrativa e penal no abuso do uso das algemas; j) é possível a manutenção do réu algemado, desde que demonstrada concretamente sua periculosidade.

Alguns problemas se verificam quanto à lógica da própria decisão: a) Se a manutenção do réu algemado sugestiona os jurados e desequilibra o julgamento a ocorrer, então é possível que os réus sobre os quais pesem elementos de periculosidade sejam julgados por jurados sugestionados e mediante desequilíbrio de julgamento? Eis que a decisão é permissiva ao uso das algemas nos casos de tais réus; b) se o argumento de que a força policial presente não é fundamento suficiente para a manutenção de um réu algemado, eis que a “deficiência da estrutura do Estado” não autoriza o desrespeito à dignidade do preso, então haverá argumento suficiente para a manutenção, de quem quer que seja, sob o uso de algemas? Eis que, em tese, em qualquer caso, mesmo sendo o preso o pior dos terroristas, ou dos homicidas, ou dos chefões do tráfico, poderá o Estado suprir de muitos policiais (ou mesmo com o uso das forças armadas) a segurança de locais onde haverá audiência ou julgamento de réus presos, aliás, em tese, poderá o Estado estancar gastos em várias áreas para a contratação de força policial suficiente para que não se usem mais algemas.

Contudo, o objeto do presente estudo não é a decisão em si, mas sim, a Súmula Vinculante que ajudou a compor, cuja análise será feita na seqüência.







3 – DA SÚMULA VINCULANTE



A Emenda Constitucional 45, de 2004, também conhecida como Reforma do Judiciário, trouxe inovações à Carta Constitucional, dentre estas, o artigo 103-A15, com o seguinte teor:

Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.



A Lei 11.417/06 regulamentou o assunto, disciplinando a edição, a revisão e o cancelamento de enunciado de súmula vinculante. Do artigo 2º de referida lei:

Art. 2o  O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, editar enunciado de súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma prevista nesta Lei.

§ 1o  O enunciado da súmula terá por objeto a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja, entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública, controvérsia atual que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre idêntica questão.

§ 2o  O Procurador-Geral da República, nas propostas que não houver formulado, manifestar-se-á previamente à edição, revisão ou cancelamento de enunciado de súmula vinculante.

§ 3o  A edição, a revisão e o cancelamento de enunciado de súmula com efeito vinculante dependerão de decisão tomada por 2/3 (dois terços) dos membros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária.

§ 4o  No prazo de 10 (dez) dias após a sessão em que editar, rever ou cancelar enunciado de súmula com efeito vinculante, o Supremo Tribunal Federal fará publicar, em seção especial do Diário da Justiça e do Diário Oficial da União, o enunciado respectivo.”

Do disposto Constituticional e da Lei regulamentadora, seguro afirmar que a edição de uma súmula vinculante deverá obedecer a alguns critérios, dentre outros:

  1. decisão de dois terços dos membros do Supremo Tribunal Federal;

  2. após reiteradas decisões;

  3. as decisões precedentes devem tratar de matéria constitucional;

  4. a súmula deverá ter por objeto a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas;

  5. as normas a que se atribuirá validade, interpretação e eficácia devem contar com controvérsia entre órgãos judiciários, ou entre esses e a administração pública;

  6. a controvérsia, que deverá ser atual, deve acarretar grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica;

  7. a publicação do enunciado no Diário da Justiça e no Diário Oficial da União.



Submetendo a Súmula Vinculante número 11 à luz destes critérios, possível é a reposta à primeira indagação objeto do presente artigo, que trata da formalidade de sua edição.

Em consulta ao DJe n° 214/2008, de 12 de novembro de 2008, verificamos que foram obedecidos os critérios de número mínimo de membros (a decisão contou com voto favorável de nove ministros). De plano também observada a formalidade da publicação.

Outra formalidade observada é a constitucionalidade do tema, o que se deduz do fato de que a mesma matéria foi conhecida e julgada por quatro vezes perante o próprio Supremo Tribunal Federal, aliado ainda à observância do artigo 322 e parágrafo único16, do Regimento Interno da casa, em que pese a súmula ser divulgada na imprensa17 sob o apelido de “Súmula Cacciola-Dantas”.

Contudo, os demais critérios para a edição de uma súmula vinculante não encontram abrigo na edição da Súmula reguladora do uso das algemas, eis que não há notícia de qualquer outra decisão do Supremo Tribunal Federal que trate da regulamentação do uso de algemas, salvo as quatro já descritas neste artigo, por sua vez, destas quatro decisões, três não aliaram o uso de algemas à qualquer infração civil ou administrativa, por parte do agente público ou do Estado, e duas delas não descreveram quando haveria constrangimento ilegal no uso de algemas, tampouco aliaram a conduta como se crime fosse, mesmo que em tese.

Contudo a Súmula Vinculante nº 11, apregoa:

SÓ É LÍCITO O USO DE ALGEMAS EM CASOS DE RESISTÊNCIA E DE FUNDADO RECEIO DE FUGA OU DE PERIGO À INTEGRIDADE FÍSICA PRÓPRIA OU ALHEIA, POR PARTE DO PRESO OU DE TERCEIROS, JUSTIFICADA A EXCEPCIONALIDADE POR ESCRITO, SOB PENA DE RESPONSABILIDADE DISCIPLINAR, CIVIL E PENAL DO AGENTE OU DA AUTORIDADE E DE NULIDADE DA PRISÃO OU DO ATO PROCESSUAL A QUE SE REFERE, SEM PREJUÍZO DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO.



Presente na Súmula e nas quatro decisões anteriores que a fundamentam, o apontamento de que é regular o uso de algemas quando justificada a conduta. Logo, embora discutível se quatro decisões anteriores podem ser consideradas como “reiteradas” para os efeitos do artigo 103-A, da Constituição Federal, ao menos alcança o significado primeiro da palavra “reiteradas”, ou seja, repetidas, o que transmite a idéia de uma decisão primeira repetida por pelo menos duas outras, eis que a palavra está no plural.

Entretanto, as reiterações não acontecem quanto aos dizeres18: “só é lícito o uso de algemas”; “fundado receio de fuga”; “sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal, do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado”. Logo, grande parte do texto sumulado não encontra a condição de “reiteradas decisões”, necessária à edição de uma súmula vinculante.

Em que pese o esforço verificado nas duas decisões que antecederam a Súmula Vinculante n° 11, em dar interpretação a dispositivo de norma determinada, no caso, do artigo 284, do Código de Processo Penal, sob o entendimento de que o uso de algemas se incluí no “emprego de força”, fato é que a norma a tratar especificamente do assunto é o artigo 199, da Lei 7.210/84, não ignorado pelos Julgadores, eis que mencionado em ambas as decisões, e que de forma bastante clara expõe: “O emprego de algemas será disciplinado por decreto federal”. Se a norma que trata do assunto remete à edição de outra que então irá disciplinar este objeto, pode o julgador utilizar-se de norma outra e interpretá-la como se do mesmo objeto trata-se? O que de fato se verifica é o Poder Judiciário, via súmula vinculante, disciplinando o uso de algemas, o que deveria ter se regulamentado por outros meios. Aliás, esclarecedores dois momentos do voto relativo à decisão última motivadora da súmula: “A ausência de norma expressa prevendo a retirada das algemas durante o julgamento não conduz à possibilidade de manter o acusado em estado de submissão ímpar”; “É hora de o Supremo emitir entendimento sobre a matéria, inibindo uma série de abusos notados na atual quadra” (negritos nossos). Destes argumentos conclui-se que a edição da súmula vinculante nº 11 não teve por objeto a validade, interpretação ou eficácia de norma, mas sim a regulamentação do uso de algemas em face da ausência de norma que o fizesse.

Por fim, resta observar a Súmula Vinculante nº 11, sob a indagação: Trata a controvérsia de tema atual, que acarreta grave insegurança jurídica e de relevante multiplicação de processos sobre questões idênticas?

Quanto à atualidade do tema, a resposta é negativa, ao observarmos que das quatro decisões que antecederam à súmula vinculante, duas já contam com mais de 10 (dez) anos, e uma foi proferida sob a égide de Constituição anterior, ou seja, o tema não é novo, tampouco o é o uso de algemas na condução de presos. Contudo, não alcança o presente artigo, nem tem a pretensão de fazê-lo, a verificação dos critérios de grave insegurança jurídica que a controvérsia do tema “uso de algemas” causa, tampouco da relevante multiplicação de processos, eis que tal resposta dependeria de pesquisa nos órgãos judiciários pátrios. Certo, entretanto, que para a edição da súmula tais critérios deveriam ser observados e consignados nos debates e motivos de sua aprovação, e desta fonte extraímos que alguma discussão houve sim quanto à segurança jurídica, no que toca à exposição pública de presos algemados, mas nada a respeito da “relevante multiplicação de processos”.

Logo, apenas parte da formalidade necessária à edição de uma súmula vinculante foi observada.



4 – MODELOS HERMENÊUTICOS

Além do caráter formal pertinente o questionamento: A que base teórica recorreram, consciente ou inconscientemente, os senhores ministros para a edição da Súmula Vinculante n° 11?

A indagação nasce da aceitação da idéia “que nenhuma das convicções que temos, sobre o mundo e o que está nele, nos é imposta por uma recalcitrante realidade independente da teoria; de que as opiniões que temos são mera conseqüência de termos aceitado alguma estrutura teórica particular”19.

E uma vez identificado com qual modelo hermenêutico se alia a edição da Súmula Vinculante de n° 11, poder-se-á, em estudos complementares, fazer um vínculo entre esta e outras decisões do Supremo Tribunal Federal, a fim de que se afirme da coerência ou incoerência da Corte Suprema quanto ao uso de paradigmas em seus julgados, e conseqüentemente verificar-se da maior ou menor previsibilidade no trato das matérias.

Por certo este simples artigo não dará conta de verificar cada um dos modelos hermenêuticos propostos na modernidade e pós-modernidade, portanto o escrito limitar-se-á a duas representações hermenêuticas: Positivismo e neo-Constitucionalismo, este sob os eixos analíticos nominados por VIANNA20 como procedimentalista e substancialista.



4.1 – DO MODELO POSITIVISTA

Necessária a verificação da edição da súmula vinculante n° 11, frente ao positivismo, por dois aspectos. Primeiro porque o positivismo e sua pretensão de normatização total via regras, embora falhe em sua promessa, dá conta de grande parte da solução dos conflitos21, e em segundo lugar porque no Brasil, o paradigma positivista ainda encontra ampla guarida, o que se verifica dos textos dos juristas e das decisões cotidianamente exaradas por juízes singulares e tribunais22.

E o que prega o modelo positivista? Inicialmente, é devida a observação que várias são as vertentes de idéias abrigadas sob o termo “positivismo”, como a Escola da Exegese, representada por doutrinadores como Jean Charles Demolombe e Victor Napoleón Marcadé, que identificam todo o Direito com o direito positivado. Assim, será o intérprete julgador mero reprodutor da idéia textual da regra posta, comumente chamado de “boca da lei”. Ou ainda a Escola Histórica do Direito que reconhecia o Direito como produto histórico, abrindo ao intérprete a possibilidade da pesquisa à intenção do legislador ao editar a lei.

De qualquer forma, em que pese as várias faces do positivismo, este irá apresentar lugares comuns a estas vertentes. O tratado da Teoria Pura do Direito de KELSEN os retrata e a tal obra nos recorreremos para a descrição de alguns postulados positivistas. Um destes lugares comuns ao positivismo é o reconhecimento das normas positivadas como formadora do Direito23. Outro ponto comum é a obediência da norma estar sujeita tão somente à sua validade e eficácia. Tal validade assume aspecto meramente formal, ou seja, produzida nos moldes anteriormente forjados, por autoridade competente e sem ferir norma hierarquicamente superior24. Assim vista, pouco importará o conteúdo da norma25, desde que sua criação tenha obedecido à forma prevista em outra norma de hierarquia superior. Tal postulado afasta a discussão do “justo” ou “injusto” como argumentos de análise sobre a validade da norma.

Contudo, mais próximo ao tema do presente trabalho é a prescrição positivista de prevalência do legislador sobre o julgador. O papel do legislador, para o positivismo, assume maior importância, eis que sua promessa é a regulação de todos os possíveis conflitos pela lei. Por sua vez, o Poder Judiciário é explicitado em KELSEN como o verificador da constitucionalidade (formal) da norma a ser aplicada no conflito que se lhe apresente, cabendo-lhe ainda o exame da quaestio facti e da quaestio juris26.

Sob tal ótica, o poder judiciário assume um papel de aplicador final da regra geral a casos concretos, dentro de um limite de discricionariedade, que Kelsen titula de “moldura” e esta constituída pelo Direito positivado, seu papel será de continuação na criação jurídica iniciada pelo legislador e não de início deste processo de criação27.

Indaga-se então: se ao juiz cabe tão somente a verificação se a norma posta está de acordo com norma superior, ou seja, se válida formalmente e, em caso positivo, a aplicação desta norma ao conflito que lhe é dirigido, poderá o julgador interpretá-la?

Em seu início alguns radicalismos quanto à impossibilidade de interpretação foram declarados no seio positivista, como a pregação de BECCARIA:

Qual será, então, o legítimo intérprete das leis? O soberano, isto é, o depositário das vontades atuais de todos; e nunca o juiz, cujo dever consiste exclusivamente em examinar se tal homem cometeu ou não um ato ofensivo às leis”28



Contudo, verificada que não há como o ler sem o interpretar, nem tampouco que um conjunto de normas, por mais extenso e complexo, não será capaz de regular todos os possíveis conflitos, em geral, o positivismo aceita a interpretação pelo julgador, desde que limitada à vontade do legislador e à semântica29.

Outra indagação a ser respondida é quanto ao papel do juiz quando da ausência de norma positivada. A resposta do positivismo, ressalvadas algumas posições radicais30, se explicita na obra de KELSEN31:

Se a concepção ético-política do juiz toma o lugar da concepção ético-política do legislador, este abdica em favor daquele. A tentativa de limita esta atribuição de competência aos casos que o legislador não previu tem, no entanto, de esbarrar com o fato de o legislador também não poder determinar estes casos. Se os pudesse determinar, regulá-los-ia ele mesmo positivamente. A suposição do tribunal de que um caso não foi previsto pelo legislador e de que o legislador teria formulado o Direito de diferente modo se tivesse previsto o caso, funda-se quase sempre numa presunção não demonstrável. A intenção do legislador somente é apreensível com suficiente segurança quando adquira expressão no Direito por ele criado. Por isso, o legislador, para limitar a atribuição deste poder aos tribunais, atribuição considerada por ele como inevitável, recorre à ficção de que a ordem jurídica vigente, em certos casos, não pode ser aplicada – não por uma razão ético-político-subjetiva, mas por uma razão lógico-objetiva -, de que o juiz somente pode ser fazer de legislador quando o Direito apresente uma lacuna.” pp 275/276.

Ou seja, na ausência de norma positiva a apresentar solução ao caso concreto, o juiz far-se-á legislador. O que se dá sem nenhum critério, além da verificação de uma ausência da norma positivada.

Sob a luz destes aspectos gerais do positivismo – o Direito como sendo o Direito positivado; a observação apenas formal de validade da norma; a prevalência do legislador sobre o intérprete julgador; a interpretação limitada à busca da vontade do legislador e ao significado do texto; o papel do poder judiciário quando na ausência de norma positiva reguladora de casos concretos; - indaga-se se quando da decisão de editar a Súmula Vinculante de nº 11, os senhores ministros utilizaram-se de paradigma positivista?

No caso, a resposta deve ser construída com outra indagação e resposta: quando da decisão de edição da súmula alguma norma positivada tratava do assunto? As duas últimas decisões que originaram a súmula apontam alguns dispositivos em vigor, a saber: § 1°, do artigo 234, do Código de Processo Penal Militar32; artigo 199, da Lei 7.210/8433; artigo 10, inciso III, da Lei 9.537/9734; artigos 28435 e 47436, § 3°, do Código de Processo Penal; artigo 5°, incisos III e X, da Constituição Federal37; artigo 5, item 2 do Pacto de São José da Costa Rica38.

De plano, observa-se que as regras contidas no Código de Processo Penal Militar, na Lei 9.537/97, no artigo 474 do Código de Processo Penal, as únicas que no ordenamento jurídico nacional em vigor regulam o uso de algemas, possuem caráter especial, ou seja, servem a um fim predeterminado e específico, respectivamente, ao processo penal militar, às embarcações e ao tribunal do júri, por conseqüência não possuem caráter de regulamentação geral, ao contrário da súmula editada.

Por sua vez, as normas constitucionais, o pacto internacional e o artigo 284, do Código de Processo Penal, não tratam do uso de algemas, mas de aspectos outros como o tratamento humano degradante, a honra e o uso da força apenas para casos em que esta for necessária. Logo, qualquer conclusão de que o uso de algemas estaria regulado por tais normas depende da construção de um raciocínio lógico, onde os termos “tratamento degradante”, “honra” e “uso da força”, referem-se ao uso de algemas para o transporte ou manutenção de pessoa sob custódia do Estado.

A observar-se tal condição – de que algumas regras tratam do uso de algemas mas em caráter especial, e outras de caráter geral foram interpretadas como se do assunto tratassem – a conclusão seria de uma de que a decisão tomou como paradigma o positivismo conforme apresentado por KELSEN. Tal raciocínio é possível, ante a previsão positivista geral da possibilidade de interpretação, desde que vinculada a uma moldura, ou seja, desde que a interpretação encontre seus limites no sistema jurídico posto, bem como pela permissividade positivista de uma interpretação semântica, assim o “uso da força” foi lido e entendido como “uso de algemas”.

Contudo, este primeiro raciocínio, embora válido, não é possível ao caso, eis que no bojo do sistema jurídico pátrio está o artigo 199, da Lei de Execuções Penais, norma de caráter geral39, que trata do uso de algemas da seguinte forma: “O emprego de algemas será disciplinado por decreto federal”, ou seja, o legislador, democraticamente eleito, com preeminência sobre a julgador no paradigma positivista, dispôs que a regulamentação do uso de algemas, de forma geral, será de responsabilidade do Presidente da República, via decreto.

Tal circunstância, sob a ótica positivista apresentada por KELSEN, impede que o poder judiciário regulamente o uso de algemas, eis que um mandamento positivado trata especificamente da matéria e transfere ao poder executivo a regulamentação do tema.

Mas ainda um outro argumento a favor de um paradigma positivista como norte na decisão do Supremo Tribunal Federal pode ser objeto de análise: se o legislador outorgou ao chefe do executivo a regulamentação do uso de algemas, e este não o fez, e se passaram mais que vinte e anos entre a vigência da Lei de Execuções Penais e a Súmula Vinculante n° 11, o que se mostra não é uma questão de interpretação de leis, mas sim, de um vácuo normativo a ser preenchido. Por sua vez, no caso da ausência de norma positivada a regular o tema, estaria livre o julgador a fazê-lo. Ora, o caso concreto pedia uma decisão sobre a possibilidade ou não do uso de algemas no transporte da pessoa presa e da manutenção desta pessoa algemada em sala de audiência, enquanto que no ordenamento jurídico pátrio, como norma geral, apenas um mandamento de delegação não cumprido, ou seja, o silencio.

Tal argumento possui força, mas é vencido pela observação de que os senhores ministros, quando das duas últimas decisões que subsidiaram a súmula em debate, não pouparam esforços em vincular o julgado à interpretação do artigo 284, do CPP, onde vincularam o termo “uso de algemas” com o “uso da força”, este extraído da letra da lei, ou seja, não era a visão positivista de vácuo de lei que seguiam como paradigma, mas sim a busca, via interpretação, da regulamentação do tema em alguma lei posta. Tais observações afastam o paradigma positivista da decisão de edição da Súmula Vinculante n° 11.



4.2 – DOS MODELOS PROCEDIMENTALISTA E SUBSTANCIALISTA:

A pregação positivista perdeu força e exigiu mudanças efetivas após a segunda guerra mundial e queda dos regimes totalitários, afirmação esta verificável em vários pesquisadores e pensadores do Direito e descrita com maestria em um pequeno texto veiculado em uma circular dirigida aos estudantes da Universidade de Heidelberg pelo professor RADBRUCH, defensor do positivismo nos tempos pré-guerra, e que se atentou para as conseqüências da estrita observância de leis independentes de interpretação e livre da análise de (in)justiça. Do texto:

A lei vale por ser lei, e é lei sempre que, como na generalidade dos casos, tiver do seu lado a força para se fazer impor.

Esta concepção de lei e sua validade, a que chamamos Positivismo, foi a que deixou sem defesa o povo e os juristas contra as leis mais arbitrárias, mais cruéis e mais criminosas.”



Pós guerra, o desprezo do papel da filosofia do Direito e as teorias gerais voltadas a uma ciência positiva do Direito foram revistos. Várias concepções se sucederam ao positivismo e suas vertentes, algumas de ordem formalistas outras idealistas, novas constituições apresentaram novas garantias individuais e sociais, o chamado Estado de Direito verificado em meio das idéias positivistas passou a dar lugar ao Estado Democrático de Direito. O valor justiça volta ao debate do Direito, e o Direito não mais se confunde com nas normas positivadas, e o próprio conceito e classificação das normas passa a ser revisto, com a divisão destas entre regras e princípios.

O Estado Democrático de Direito traz consigo uma carga de direitos fundamentais, positivados em várias constituições40 em um avanço na busca pelos cumprimentos das promessas da modernidade.

No dizer de STRECK41:

“A noção de Estado Democrático de Direito está, pois, indissocialmente ligado à realização dos direitos fundamentais. É desse liame indissolúvel que exsurge aquilo que se pode denominar de plus normativo do Estado Democrático de Direito. Mais do que uma classificação de Estado ou de uma variante de sua evolução histórica, o Estado Democrático de Direito faz uma síntese das fases anteriores agregando a construção das condições de possibilidades para suprir as lacunas das etapas anteriores, representadas pela necessidade do resgate das promessas da modernidade, tais como igualdade, justiça social e a garantia dos direitos humanos fundamentais.”



Neste contexto o Poder Legislativo perde forças e o Poder Judiciário é incluído no espaço da Política42. O Estado Democrático de Direito está a exigir dos magistrados e também dos membros do Ministério Público um papel político43, como forma da instalação da prometida democracia e como resposta à insuficiência do ordenamento positivado para solução dos conflitos.


“Tais fatores provocam um redimensionamento na clássica relação entre os Poderes do Estado, surgindo o Judiciário (e suas variantes de justiça constitucional, nos países que adotaram tribunais ad hoc) como uma alternativa para o resgate das promessas da modernidade, onde o acesso à justiça assume uma papel de fundamental importância, através do deslocamento da esfera de tensão, até então calcada nos procesimentos políticos, para os procedimentos judiciais”44.



O Poder Judiciário está a assumir papel de maior relevância frente a paradigmas anteriores, como o Positivismo, e isto é ponto comum no pensamento do Direito contemporâneo e conseqüência lógica do que seja um Estado Democrático de Direito voltado para o cumprimento de direitos fundamentais, a questão é qual o modo pelo qual este novo papel político passa a ser exercido.

Como instrumento útil à resposta da indagação acima VIANNA45 apresenta dois eixos analíticos, separação adotada também por STRECK46, o Procedimentalismo e o Substancialismo.

Em sendo o objeto do presente artigo a verificação de qual teoria estaria a embasar a Súmula Vinculante de nº 11, que como já visto tratou de criar ordenamento jurídico novo, possível o pronto descarte de que o mote teórico tenha sido procedimentalista, eis que tal pensamento capitaneado por autores como HABERMAS e GARAPON “critica, assim, a idéia de concretização dos valores materiais constitucionais, aludindo que, ‘ao deixar-se conduzir pela idéia da realização de valores materiais dados preliminarmente no direito constitucional, o tribunal constitucional transforma-se numa instância autoritária”47.

Para Habermas, o papel do Poder Judiciário, no Estado Democrático de Direito, é o de garantir o processo de criação democrática do Direito, zelando para que os cidadãos tenham meios para verificação de seus problemas e meios políticos para a solução48.

Por conclusão lógica, a criação de ordenamento novo (extensão da restrição do uso de algemas em todos os casos em face do princípio da dignidade da pessoa humana) não atende o paradigma habermasiano, pelo que segue-se a análise da Súmula tão somente quanto a possível base teórica substancialista.

E se no Estado Democrático de Direito o Poder Judiciário assume novo papel na vida política, é na corrente de pensamento substancialista que a voz dos Juízes encontra maior alcance.

“Na perspectiva substancialista, concebe-se ao Poder Judiciário uma nova inserção no âmbito das relações dos Poderes de Estado, levando-o a transcender as funções de cheks and balances, ou seja, como bem lembra Vianna, mais do que equilibrar e harmonizar os demais poderes, o judiciário, na tese substancialista, deve assumir o papel de um intérprete que põe em evidência, inclusive contra as maiorias eventuais, a vontade geral implícita no direito positivo, especialmente nos textos constitucionais, e nos princípios como de valor permanente na sua cultura de origem e na do Ocidente...”49


Ou ainda:


Dito de outro modo, na esteira das teses substancialistas, entendo que o Poder Judiciário (especialmente a justiça constitucional) deve assumir uma postura intervencionista, longe da postura absenteísta, própria do modelo liberal-individualista-normativista que permeia a dogmática jurídica brasileira”50.



Portanto, o modelo substancialista apresenta o Poder Judiciário como intervencionista, guardião dos direitos fundamentais positivados na Constituição e afastado das anteriores disposições positivistas de interpretação de normas.

Resta então verificarmos a Súmula Vinculante nº 11 à luz de tais preceitos.

Quanto ao intervencionismo, repisamos os argumentos já lançados de que o ordenamento jurídico conta com previsão legal – regra aprovada pelo Poder Legislativo - em que delega a regulamentação do uso de algemas ao Poder Executivo, portanto, qualquer decisão judicial a tratar do tema, regulando o uso de algemas (como norma de caráter geral) é, sim, óbvia intervenção.

No que tange à defesa dos direitos fundamentais, a pesquisa aos debates que originaram a Súmula Vinculante ora em pauta, dá conta de que a argumentação basilar de edição da sumular deu-se em torno do respeito à dignidade da pessoa humana e outros princípios positivados na Constituição Federal, conforme se verifica abaixo51:


“O EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO:


(...)


A regra é ter-se, com as cautelas próprias, a condução do cidadão, respeitando-se, como requer a Constituição Federal, a respectiva integridade física e moral. P.14


Mencionei, Presidente, como referências, em primeiro lugar, o diploma primário, o diploma básico - a Constituição Federal -, aludindo ao artigo 1º, que versa os fundamentos da República e revela, entre esses, o respeito à dignidade humana. Também fiz alusão, sob o ângulo constitucional, a outra garantia: a garantia dos cidadãos em geral, dos brasileiros e dos estrangeiros residentes no Brasil com respeito à integridade física e moral. Em última análise, mencionei o inciso XLIX do artigo 5º a revelar que há de se respeitar a integridade física e moral do preso. Lastimavelmente, no Brasil, considerados os danos, a responsabilidade civil, administrativa e até a penal ainda engatinham.


(...)


O EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO:


(...)


Senhor Presidente, entendo que a redação proposta pelo Ministro Cezar Peluso, em seqüência do Ministro Marco Aurélio, atende bem às exigências constitucionais. Eu me louvo muito na Constituição.


(...)


O EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO:


O que a redação consagra é a tese da excepcionalidade do emprego de algemas. Essa tese que arranca diretamente da Constituição está explicitada, está consagrada na proposta de redação, porque a Constituição é que diz com todas as letras, art. 5º:


“III - ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano

ou degradante;”


Esse tratamento degradante significa infamante, humilhante, como se dá quando o ser humano, ainda que preso em flagrante de delito, é exibido ao público como se fosse um troféu, uma caça, numa atmosfera de exibicionismo policial.


(...)


O EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO:


Perfeito. Depois, a Constituição, não satisfeita com essa determinação em prol da dignidade da pessoa humana, diz no inciso XLIX do mesmo art. 5º: “XLXI - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;”


E não há dúvida de que o uso das algemas exacerba o estado de privação da liberdade com conseqüências de ordem física e de ordem moral.


Na verdade, quando estamos a falar hoje desta questão da algema, na prática brasileira, estamos a falar da aposição da algema para os fins de exposição pública, que foi objeto inclusive de considerações específicas no voto do Ministro Marco Aurélio. De modo que é preciso que estejamos atentos. Certamente temos encontro marcado também com esse tema. A Corte jamais validou esse tipo de prática, esse tipo de exposição que é uma forma de atentado também à dignidade da pessoa humana. A exposição de presos viola a idéia de presunção de inocência, viola a idéia de dignidade da pessoa humana, mas vamos ter oportunidade, certamente, de falar sobre isto”.



Os princípios norteadores da República, o princípio da dignidade da pessoa humana, a garantia do respeito à integridade física e moral dos presos e o impedimento constitucional do tratamento desumano ou degradante foram institutos jurídicos utilizados como fundamentos da edição da Súmula Vinculante nº 11, pelo que a Corte Constitucional, demonstra, por sua decisão, a idéia substancialista de um Poder Judiciário defensor dos princípios fundamentais.

Talvez o único ponto verificável da edição da Súmula Vinculante nº 11 em que os Ministros do Supremo Tribunal Federal não se mostrem subtancialistas (conscientemente ou não) é quanto à preocupação em demonstrar interpretação de norma infra-constitucional, segundo ditames de hermenêutica clássica, conforme disposto pelo Ministro Relator:

“Mais do que isso: o Tribunal, tendo em conta o precedente a que me referi, assentou que o próprio Código de Processo Penal contém dispositivo que, interpretado, sob o ângulo teleológico, do objetivo da norma, conduz ao afastamento do uso abusivo das algemas”52.



Contudo, ante o teor dos debates e das decisões anteriores já transcritos, verificável que a justificação em interpretação de dispositivo do Código de Processo Penal dá-se mais como resquício da necessidade de uma amparo legal positivado no sistema jurídico infra-constitucional (mesmo que para a matéria baste a Constituição) do que como fundamento para a edição da Súmula Vinculante examinada.

Portanto, o pano de fundo verificável na edição da Súmula Vinculante nº 11 enquadra-se perfeitamente nas idéias teóricas substancialistas apresentadas por STRECK, nas quais o Poder Judiciário intervém no sistema jurídico resgatando princípios fundamentais previstos na Constituição.



5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo tem a pretensão de responder a dois questionamentos: A edição da Súmula Vinculante que regula o uso de algemas observa o artigo 103-A, da Constituição Federal, dispositivo que possibilita sua própria existência? A Súmula Vinculante que regula o uso de algemas é fruto e se vincula a que modelo hermenêutico dentre os observáveis e teorizados no Estado de Direito?

Após análise das decisões anteriores e debates que fundaram a Súmula sob estudo, encontramos resposta negativa à primeira indagação, apresentando-se várias incompatibilidades entre a Súmula editada e os preceitos legais/constitucionais que legitimam sua edição.

Quanto ao segundo questionamento, sobre a vinculação da edição da Súmula Vinculante número 11 a algum modelo hermenêutico, após a descrição de dois sistemas teóricos - Positivismo e Substancialismo – com rápida incursão no modelo Procedimentalista, aponta a pesquisa, como pano de fundo à decisão da Suprema Corte, o viés Substancialista.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. Tradução Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

ATIENZA, Manuel. ROMERO, Juan Ruiz. La dimension Institucional del derecho y la justificación jurídica. Alicante: Revista Doxa, n° 24, 2001.

BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. São Paulo: Martin Claret, 2002.

FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. Trad. Ana Paula Zomer Sica et. al., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

HERKENHOFF, João Baptista. Como aplicar o direito. 11ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Tradução João Baptista Machado. 6ª edição. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2003.

ROSA, Alexandre Morais. Crítica à hermenêutica do conforto: A súmula (vinculante) como se imagem fosse. Separata de Constituição e Estado Social: Os obstáculos á concretização da Constituição. Coimbra Editora: 2008.

STRECK, Lenio Luiz. A atualidade do debate da crise paradigmática do direito e a resistência positivista ao neoconstitucionalismo. Revista do Instituto de Hermenêutica Jurídica vol. 1, n° 4. Porto Alegre: Instituto de Hermenêutica Jurídica, 2006.

_____________________. Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do Direito. 8ª ed. rev. atual. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora: 2009.

VIANNA, Luiz Werneck... [et al]. A judicialização da política e das relações sociais no Brasil – Rio de Janeiro. Revan, 1999.








1 O autor é aluno do curso de Mestrado Acadêmico em Ciência Jurídica da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI; professor das disciplinas de Processo Penal e Prática Jurídica Penal em Curso de Especialização “lato sensu” da Escola do Ministério Público e membro do Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

2 Sumula Vinculante is a brazilian institute created to ceasing the excessive reproduction of heterogeneous judicial decisions.

3 “Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga, ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do estado”.

4 RHC 56.465-8; HC 71.195-2.

5 HC 89.429-1.

6 HC 91952.

7 Sobre o assunto recomendamos a seguinte leitura: ROSA, Alexandre Morais. Crítica à hermenêutica do conforto: A súmula (vinculante) como se imagem fosse. Separata de Constituição e Estado Social: Os obstáculos á concretização da Constituição. Coimbra Editora: 2008.

8 Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

9 “Chamarei de ‘vigência’ a validade apenas formal das normas tal qual resulta da regularidade do ato normativo; e limitarei o uso da palavra ‘validade’ à validade também material das normas produzidas, quer dizer, dos seus significados ou conteúdos normativos”. (FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. Trad. Ana Paula Zomer Sica et. al., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 330-331)

10 DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. Tradução Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p 254.

11 http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=11.NUME.%20E%20S.FLSV.&base=baseSumulasVinculantes - visualizado em 07/05/2009;

12 Adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da  Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948

13 “Não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso”;

14 http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/hc91952.pdf - visualizado em 07/05/2009;

15 Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004);

16Art. 322. O Tribunal recusará recurso extraordinário cuja questão constitucional não oferecer repercussão geral, nos termos deste capítulo. Parágrafo único. Para efeito da repercussão geral, será considerada a existência, ou não, de questões que, relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, ultrapassem os interesses subjetivos das partes”. (Atualizado com a introdução da Emenda Regimental n. 21/07).

17 http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20080821/not_imp227989,0.php visualizado em 07/05/2009;

18 Tais textos não são meramente voluptuários, mas ao contrário, encontram eco no sistema jurídico e são aptos a produzir efeitos.

19 DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. Tradução Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2005. p 254.

20 VIANNA, Luiz Werneck... [et al]. A judicialização da política e das relações sociais no Brasil – Rio de Janeiro. Revan, 1999. p. 24.

21 “El primeiro nivel esta integrado por las reglas del sistema y opera de tal manera que, em muchos casos (en la grande mayoría de los casos) las decisiones se justifican sin necessidad de entrar en un processo deliberativo en el que se sopesen las razones, los princípios que puede haber en favor e en contra de una determinada decisión.” ATIENZA, Manuel. ROMERO, Juan Ruiz. La dimension Institucional del derecho y la justificación jurídica. Alicante: Revista Doxa, n° 24, 2001. p. 121.

22 “... parte considerável do direito ainda sustenta posturas objetivistas (em que a objetividade do texto sobrepõe-se ao intérprete, ou seja, a lei ‘vale tudo’, espécie de consolidação do ‘paraíso dos conceitos do formalismo’ de que falava Hart)”; “O novo constitucionalismo – que exige uma nova teoria das fontes, uma nova teoria da norma e um novo modo de compreender o direito – ainda não aconteceu, com a necessária suficiência, em terrae brasilis.” “Este é o estado da arte do modus interpretativo que ainda domina o imaginário jurídico prevalente em parcela considerável da doutrina e da jurisprudência praticada no Brasil.” STRECK, Lenio Luiz. A atualidade do debate da crise paradigmática do direito e a resistência positivista ao neoconstitucionalismo. Revista do Instituto de Hermenêutica Jurídica vol. 1, n° 4. Porto Alegre: Instituto de Hermenêutica Jurídica, 2006. p. 224 e 225.

23 “Na verdade, o Direito, que constitui objeto deste conhecimento, é uma ordem normativa da conduta humana, ou seja, um seja, um sistema de normas que regulam o comportamento humano. Com o termo ‘norma’ se quer significar que algo deve ser ou acontecer, especialmente que um homem se deve conduzir de determinada maneira.”; “As normas de uma ordem jurídica têm de ser produzidas através de um ato especial de criação. São normas postas, quer dizer, positivas, elementos de uma ordem positiva”. KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Tradução João Baptista Machado. 6ª edição. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2003. p. 5 e 221.

24 “Uma norma Jurídica não vale porque tem um determinado conteúdo, quer dizer, porque o seu conteúdo pode ser deduzido pela vida de um raciocínio lógico do de uma norma fundamental pressuposta, mas porque é criada por uma forma determinada – em última análise, por uma forma fixada por uma norma fundamental pressuposta. Por isso, e somente por isso, pertence ela à ordem jurídica cujas normas são criadas de conformidade com esta norma fundamental. Por isso, todo e qualquer conteúdo pode ser Direito.” KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Tradução João Baptista Machado. 6ª edição. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2003. p. 221.

25 “A nenhuma ordem jurídica positiva pode recusar-se a validade por causa do conteúdo das suas normas. É este um elemento essencial do positivismo jurídico.” KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Tradução João Baptista Machado. 6ª edição. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2003. p. 242.

26 “Para individualizar a norma geral por ele aplicada, o tribunal tem de verificar se, no caso que se lhe apresente, existem in concreto os pressupostos de uma conseqüência do ilícito determinados in abstracto por uma norma geral. Esta determinação do fato que condiciona as conseqüências do ilícito implica a determinação da norma geral a aplicar, isto é, a averiguação de que está em vigor uma norma geral que liga uma sanção ao fato (ou situação de fato) em apreço. O tribunal não só tem que responder à quaestio facti como também a quaestio juris. Depois de realizadas estas duas averiguações, o que o tribunal tem a fazer é ordenar in concreto a sanção estatuída in abstracto da norma jurídica geral. Estas averiguações e esta ordem ou comando são as funções essenciais da decisão judicial”; “O tribunal que tem de aplicar as normas gerais vigentes de uma ordem jurídica a um caso concreto precisa de decidir a questão da constitucionalidade da norma que vai aplicar, quer dizer: se ela foi produzida segunda o processo prescrito pela Constituição ou por via de costume que a Constituição delegue.” KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Tradução João Baptista Machado. 6ª edição. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2003. p. 263-264.

27 “Os tribunais criam Direito, a saber, - em regra – Direito individual; mas, dentro de uma ordem jurídica que institui um órgão legislativo ou reconhece o costume como fato produtor do Direito, fazem-no aplicando o Direito geral já de antemão criado pela lei ou pelo costume. A decisão judicial é a continuação, não o começo, do processo de criação jurídica.” KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Tradução João Baptista Machado. 6ª edição. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2003. p. 283.

28 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. São Paulo: Martin Claret, 2002. p. 22

29 “Quando o Direito é aplicada por um órgão jurídico, este necessita de fixar o sentido das normas que vai aplicar, tem de interpretar estas normas.” “Fixar-se na vontade presumida do legislador desprezando o teor verbal ou observar estritamente o teor verbal sem se importar com a vontade – quase sempre problemática – do legislador tem – do ponto de vista do Direito positivo – valor absolutamente igual.” KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Tradução João Baptista Machado. 6ª edição. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2003. p. 385 e 392.

30 “Os mais extremados representantes da escola (Escola da Exegese) entendiam, como Blondeau, que, em face de situações não previstas pelo legislador, deveria o juiz abster-se de julgar.” HERKENHOFF, João Baptista. Como aplicar o direito. 11ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 36.

31 KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Tradução João Baptista Machado. 6ª edição. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2003. p. 275/296.


32“O emprego de algemas deve ser evitado, desde que não haja perigo de fuga ou de agressão da parte do preso, e de modo algum será permitido, nos presos a que se refere o art. 242”. Disposto afastado pela própria Ministra Relatora ante a especialidade da norma, aplicável tão somente ao processo penal militar.

33 “O emprego de algemas será disciplinado por decreto federal”.

34 “Art. 10 O Comandante, no exercício de suas funções e para garantia da segurança das pessoas, da embarcação e da carga transportada, pode: III - ordenar a detenção de pessoa em camarote ou alojamento, se necessário com algemas, quando imprescindível para a manutenção da integridade física de terceiros, da embarcação ou da carga”.

35 “Não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso”.

36 “Art. 474 [...] § 3° Não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o período em que permanecer no plenário de júri, salvo se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes”.

37 “III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante”; “X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”;

38 “Toda pessoa privada da liberdade deve ser tratada com respeito devido à dignidade inerente ao ser humano”.

39 Art. 2° [...] Parágrafo único. Esta Lei aplicar-se-á igualmente ao preso provisório e ao condenado pela Justiça Eleitoral ou Militar, quando recolhido a estabelecimento sujeito à jurisdição ordinária.

40“A democratização social, fruta das políticas do Welfare State, o advento da democracia no pós-guerra e a redemocratização de países que saíram de regimes autoritários/ditatoriais, trazem à luz Constituições cujo texto positiva os direitos fundamentais e sociais”. STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do Direito. 8ª ed. rev. atual. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora: 2009. p. 37-38

41 STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do Direito. 8ª ed. rev. atual. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora: 2009. p. 37

42 VIANNA, Luiz Werneck... [et al]. A judicialização da política e das relações sociais no Brasil – Rio de Janeiro. Revan, 1999. p. 22.

43 Não há que se confundir aqui o termo “político” com a política pessoal ou partidária, mas sim como o ato instrumento de tomada de decisões sobre princípios, liberdade, presunção de inocência, etc.

44 STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do Direito. 8ª ed. rev. atual. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora: 2009. p. 38

45 VIANNA, Luiz Werneck... [et al]. A judicialização da política e das relações sociais no Brasil – Rio de Janeiro. Revan, 1999. p. 24.

46 “qual a relação entre o direito e a política? (...) é possível assentar o problema a partir de dois eixos analíticos: o procedimentalismo e o substancialismo. Muito embora procedimentalistas e substancialistas reconheçam no Poder Judiciário (e, em especial, da justiça constitucional) uma função estratégica nas Constituições do pós-guerra, a corrente procedimentalista, capitaneada por autores como Habermas, Garapon e Ely, apresenta consideráveis divergências com a corrente substancialista, sustentada por autores como Cappelletti, em alguma medida por Dworkin e no Brasil por juristas como Paulo Bonavides, Celso Antonio Bandeira de Mello, Ingo Sarlet, José Adércio Sampaio, Fábio Comparato, entre outros. STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do Direito. 8ª ed. rev. atual. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora: 2009. p. 38-39;

47 STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do Direito. 8ª ed. rev. atual. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora: 2009. p. 40

48 É por isso que no Estado Democrático de Direito, os Tribunais Constitucionais devem adotar uma compreensão procedimental da Constituição. Habermas propõe, pois, que o Tribunal Constitucional deve ficar limitado à tarefa de compreensão procedimental da Constituição, isto é, limitando-se a proteger um processo de criação democrática do Direito. O Tribunal Constitucional não deve ser uma guardião de uma suposta ordem suprapositiva de valores substancias. Deve, sim, zelar pela garantia de que a cidadania disponha de meios para estabelecer um entendimento sobre a natureza dos seus problemas e a forma de sua solução”. STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do Direito. 8ª ed. rev. atual. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora: 2009. p. 41

49 STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do Direito. 8ª ed. rev. atual. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora: 2009. p. 43

50 STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do Direito. 8ª ed. rev. atual. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora: 2009. p. 48

51 STF - DJe nº 214/2008 - Publicação: quarta-feira, 12 de novembro – p. 14 e segs.

http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/jurisprudenciaSumulaVinculante/anexo/DJE_11.11.2008.pdf - visualizado em 07/05/2009.




52 STF - DJe nº 214/2008 - Publicação: quarta-feira, 12 de novembro – p. 14 e segs.

http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/jurisprudenciaSumulaVinculante/anexo/DJE_11.11.2008.pdf - visualizado em 07/05/2009;